Logo que me levantei, observei que a planície do enorme tapete de seda vermelho, era interrompida por ondas. Ondulações que acreditei serem da quedas dos soldados. E, nelas, havia uma espécie de pó pálido, muito parecido esteticamente com farinha. Estes mesmos resíduos eram presentes também na almofada em que jazia a coroa, e formava plenos formatos de dedos delicados, que antes se apoiaram no estofado antes de tocar o objeto rico.
— Devo acrescentar, senhor Van Geboorte — iniciou o Rei —, que deixei o recinto da mesma forma que o encontrei. Não considerando a presença dos homens caídos, que aí faziam um fatídico repouso.
Apenas fiz um gesto de concordância com a cabeça.
Cheguei a conclusão que eram dedos femininos, a espessura era única deste sexo. Aliás, a delicadeza com o que o pó fora jogado naquele cômodo; não foi rude.
— Se me permite a invasão, Vossa Alteza, me locomoverei deste cômodo á outros. Se desejar me acompanhar, fica a vossa mercê.
— Ficarei aqui mesmo, senhor.
Me vi em passos delicados, e em olhos investigativos saindo daquele grande cômodo. Resolvi seguir logo para o quarto, que era onde Majestade descreveu onde estivera durante toda a ação criminosa. As poças secas e escuras de sangue, pintavam o carpete com seu vermelhidão intenso. Abri a porta, e tudo estava arrumado. Algumas cartas pendiam sobre a escrivaninha e o tinteiro destampado pairava por lá. Lembrei-me de Guilherme III sugerir que sua esposa uma vez afirmou que fugiria pela janela, uma vez que casa estivesse em chamas, foi quando me pus a analisar a saída da plana janela.
Com minha lente, vi marcas do mesmo pó que desmaiou os soldados da coroa holandesa, em forma de pegadas, na janela. Pronto! tinha solucionado o caso, Alguém havia fugido pela janela, e este, foi o mesmo mal-feitor que possui a coroa, agora. Mas, essa única pessoa deveria ser Sofia. O que me levou a me questionar, dentro daquela habitação confortável, com móveis todos requintados com peças douradas, o porquê de a mulher de um dos homens mais avantajados monetariamente, fugir e ainda levar a coroa. Teria uma maquia enorme se vendesse a coroa ou as peças que a compõe, mas e depois? Voltaria ela para o Palácio, se redimindo por sua ânsia por liberdade inusitada? Realmente não fazia sentido, até que me deu um súbito intelectual e tudo fez mais sentido do que nunca. A resposta estava diante de meus olhos o tempo todo, mas fui cego demais, procurando justificativas mais complexas, não as genéricas. Contudo, ainda precisava confirmar a minha teoria.
Se Sofia tivesse mesmo pulado da janela, por mais do risco considerável da altura, a mesma teria deixado algum resquício do feito para trás. Então, teria que me dedicar integralmente para comprovar a descida da recentemente intitulada, "ladra".
O pó era a evidência mais sugestiva e mais fácil de se notar. Mesmo assim, analisei os batentes da janelas por dentro, para checar se nenhuma pista de material para a preservação da integridade física da moça, foi deixada. Depois de minutos com o vento cortante devido à janela aberta, vislumbrei um par de pregos grossos, brilhando contra a luz do sol pouco intenso para o frio que o clima apresentava. Encantado com a descoberta, não me contentei apenas de vê-los pelo lado interior do recinto, mas teria de tocá-los; o que me fez ficar suspenso aos batentes apenas com meus pés envoltos do melhor sapato que tomo posse, de uma altura ameaçadora. Era claro que não tinham sido pregados havia tempo, pois os farelos da ação bruta do martelo era visível. Toquei-os, depois os encarei de pé na plataforma e, como suspeitava, continham pedaços de tecido rasgado. O que não me clareou radicalmente os horizontes como eu esperava que fosse, pois havia duas hipóteses: ou ela ter descido em tal velocidade por um trapo extenso suspenso nos pregos, que o mesmo rasgou, o que explica o afundamento no gramado do jardim traseiro; ou que a mesma tinha o plano de deslizar como descrevi, só que o tecido não suportou seu peso, e rasgou na mesma hora que ela montou-se nele. Mas a última hipótese é muito pouco provável, porque senão o seu ajudante — sim, havia uma terceira pessoa, porque tinha de derrubar os homens das duas salas, que eram vizinhas, ao mesmo tempo do roubo da coroa — não teria tempo o suficiente para socorrê-la. Além de tudo, como ela iria deslizar daqui de seu quarto, se na hora do roubo e da chacina, o Rei Guilherme III estava presente no quarto? Tudo se tornou mais obscuro.
Enquanto operava as ideias e suposições hipotéticas, meus pés sustentavam meu corpo ainda de pé no batente da janela. Quando quem eu gostaria de encontrar, aparece no quarto:
— O que faz aí, senhor Van Geboorte? — questiona o Rei, ao entrar — Não afirme a minha pessoa que também pretende se jogar desta janela, como suspeito de minha ex-mulher.
— O senhor pode ir sustentando essas loucuras, Majestade — disse eu, descendo do batente com ar confiante. — Pois estou cogitando o fato de que sua mulher não só fugira por esta janela com um trapo que a permitiria alcançar o solo sem maiores orquestras, mas também de que ela roubou a coroa.
Uma expressão de luto assumiu a face de meu cliente, que ficou pálido como o pó assassino que examinei.
— Não acredito que ela se atreveu a este feito! — exclamou com veemência, quando logo sua expressão de horror se substituiu por raiva — O que ela espera deste roubo? Mais riqueza ainda? Agora que me disse, detetive, abriu meus olhos. Pois é lógico a conexão dos fatos aqui encenados. Mas não creio que Sofia se pôs a isto. Esperava isto de todos, menos dela. Por Deus, senhor, se eu a encontrar...
— Não há de fazer nenhum alarido sequer se não deseja atrair polêmicas mundias a respeito, e o seus pensamentos violentos devem permanecer em sua mente. Nestas situações, o escândalo não é recomendável. Isto será encaminhamento da polícia de Amsterdã, se é que esta ainda funciona. Agora, se me permite, Vossa Majestade, quando veio escrever a carta à anunciando o divórcio á sua mulher, as cortinas estavam cerradas ou abertas, escancaradas como se encontram?
— Arrisco-me ao dizer que estavam escancaradas, pois esta parte esquerda estava um pouco recostada, senhor.
Isso me levou a mais teorias improváveis: talvez, eles teriam descido pela janela do quarto vizinho àquele, mas o que explicaria a condição amassada do gramado. Porém, não custa tentar provar o impossível. Me dirigi ao quarto ao lado, sem anunciar ao Rei. Lá, executei o mesmo método de dependurar-me na janela, e lá estavam os grossos pregos com retalhos rasgados entre eles, assim como na outra habitação.
Tudo não fazia sentido... Até eu analisar as pegadas nos batentes: neste, continha a mesma pegada que havia na outra, pequena e delicada, que era, obviamente, o calçado de Sofia; porém outro par de calçados lhe acompanhava. Esta pegada branca, era certamente de um homem, com traços radicais e mais despojados. Calçava aproximadamente o meu número, 42. Depois de uma análise deste conjunto de pistas, finalmente consegui identificar a marca do sapato masculino, o que não seria possível se meu pai e meu tio não fossem viciados em sapatos estrangeiros: era da marca "Dkode". Famosa marca portuguesa com modelos de couro. Geralmente, os holandeses não usam este tipo específico de sapato — uma vez que estes não são meus membros familiares —, então, eu deveria procurar por reais e legítimos imigrantes portugueses.
Os únicos imigrantes portugueses que eu tinha conhecimento, era o professor de matemática Vasco de Montra e, na verdade, apenas ele. Assim, como última, mas útil opção, tinha de recorrer ao Oficial Fritz Van Persen, de quem podia arrancar com toda liberdade documentos de civis, assim como suas fichas. Me despedi cordialmente do Rei Guilherme III, e o consultei de possíveis visitas posteriores, ele me concretou que eu poderia invadir o Palácio Real para minhas investigações sobre este caso, e que se necessário, poderia trazer parceiros, desde que comprovem ser agentes investigativos praticantes do bem.
Logo depois daquela ilustre visita ao Palácio, tomei um carro que me levaria de imediato à delegacia. Neste ínterim, aproveitei a brisa cortante do vento em minha face, enquanto chacoalhava e ouvia os penduricalhos do cocheiro no cabriolé, para refletir e juntar todas as informações ocultas e ralas que obtive. O quebrar estrondoso de um vidro, aquele pó que desmaiou os soldados servos da coroa holandesa, os pregos com trapos presentes neles. Certamente, tudo havia uma concisa sucessão, o primeiro ato da quebra barulhenta dos vidros, o segundo o desmaio conjunto dos membros que seguravam o território real, depois, a captura apressada da coroa e, por fim, a escapada pelas janelas. Mas nada justificava a roda de mortos na porta do Rei, e tudo indicava que um único matou todos para depois cometer suicídio.
O caso estava claro e parcialmente solucionado para mim, a mulher de Guilherme III fugira com a coroa e com um segundo impostor — que era, obviamente, o estrangeiro com quem a mesma traía seu marido. E que agora constatei que o mesmo é um português legítimo —, mas apenas considero a trama cem porcento fechada, quando ponho as mãos nos criminosos. E, talvez, seja tarde demais para ir atrás dos malandros, pois já se passaram algumas horas desde o feito.
Na delegacia, me dirigi tão rápido e apressadamente para a mesa de Van Persen, que os que trabalhavam no escritório frontal, nem me notaram e vieram me perseguir correndo, tentando me alcançar, até que me vi na mesa do oficial.
— Não sou um criminoso, oras! — exclamei ofegante e assim, a multidão de policiais se dissipou atrás de mim — Oficial, preciso de sua ajuda.
— Claro, em que posso ajudar? Me parece muito agitado e ofegante, por favor, tenha um charuto para que possamos nos atender melhor,
— Não. Preciso imediatamente do registro de todos os portugueses que habitam a Holanda. Por favor, faça-o rápido.
Dentro de alguns minutos, Fritz se aproxima com duas pastas feitas de papelão fino, com uma grossura não muito espessa.
— Não são muitos os portugueses que migram pros Países Baixos, Dominic, sinto muito — disse o oficial, pondo-as na mesa.— E se pretende incriminar um deles, posso lhe garantir que um não se envolve com esse tipo de finanças. Esse que possui cabelos negros e olhos claros; pois frequentamos o mesmo colégio quando migrou para cá aos dezessete anos de idade.
— Apenas dois imigrantes? Por Deus, Fritz, tem certeza que não deixou algum para trás? — perguntei, horrorizado — Ah, e muito obrigado pelas fichas.
— Tenho absoluta certeza.
Por um momento, me vi em uma prisão escura, que me cerravam os olhos diante de pôr as mãos no culpado, mas me dei conta que, se fosse apenas um suspeito, eu teria a capacidade aprimorada de arrancar-lhe detalhes.
Abri a ficha, e lá estava a rosto fotografado, em escalas acinzentadas de preto e branco, do português mentiroso que interrogou o comerciante Hendrik junto á uma garota; rosto quadrado e queixo largo. Nos documentos, está como se apresentou: porteiro da universidade mais venerada do país, com o nome de Claus Constantino.
Não perdi tempo, apanhei um dos charutos que Van Persen me oferecera, e saí correndo novamente pela delegacia. Tudo fazia sentido agora, todos os fatos que me dediquei a investigar sobre o crime. Todos formavam uma melodia cantada por anjos criminólogos em meus ouvidos, gargalhando ia minha pessoa, correndo direto ao cronograma de itinerários dos próximos trens, estourando orgulho pelas ventas. Depois de correr exaustivos 800 metros, me vi numa das placas de ferro informativas. O próximo trem era 16h30 para Portugal e para o porto, onde saía uma embarcação para a Inglaterra, ambos partiam na mesma estação. O vento nunca cantou melodia mais alegre e espontânea em meus tímpanos.
Agora, era hora de invadir o Palácio novamente para que minha teoria se concretasse e que poderíamos seguir o rastro óbvio dos dois amantes criminais. Chamei um carro e saltei dentro dele, gritei para o cocheiro ir na maior velocidade com seus alazões que já tivesse ido na vida, e assim o fez. A velocidade era tão contínua e apressada que tive o sentimento que nunca chegaríamos no destino. Foram os quilômetros mais extensos que já tive a infelicidade de presenciar. Até que enfim, saltei para as portas do recinto real.
— Acabou de ajudar na recuperação da coroa deste país, muito obrigado! — orei apressadamente para o cocheiro —.
Corri como se não houvesse outra alternativa, como se a escuridão estivesse consumindo a minha traseira e que a única opção restada, era a corrida. Cheguei escancarando a porta de entrada principal da moradia, e alguns soldados recrutados recentemente para cobrir os doentes, se alarmaram.
— Não, homens! — ordenou uma voz imperativa familiar, era Guilherme III — Este homem cumpre grande missão para comigo, ele se dispõe de seu intelecto puro para que se faça honorável a lei e justiça para com àqueles que tiveram o infortúnio de roubar a coroa.
Nisso, todos os homens abaixaram suas armas.
— Majestade, eu solucionei o caso — disse eu, ofegante. Com isso, os olhos do Rei se arregalaram de forma que pensei que ele os poria pra fora.
— Como disse?
— Isto mesmo que o senhor acabara de ouvir. E se não nos apressarmos, não conseguiremos pôr nossas mãos injustiçadas na coroa ainda hoje!
— Pois então me diga, homem de Deus, como o faremos?
— Ordene todos os seus homens restantes para a estação de trem principal da Holanda, de imigração. E faça por certeza de apanhar seu cavalo mais potente em questões de velocidade, pois iremos precisar. E sem maiores distrações, partiremos!
O Rei mal esperou-me terminar a frase, e já ordenava a criadagem a fazer o preparativos do carro, para nós e para os soldados restantes — que deveriam ser uns doze. A agitação no palácio era contínua e incentivadora, dentro de quinze minutos, estávamos prontos, também foi quando o Oficial Van Persen era trazido pelos soldados do lado exterior da residência.
— Ele diz ser parceiro de Dominic Van Persen, Vossa Majestade — descreveu um soldado, mobilizando-o por trás. Não pude deixar de notar a cara hilária do oficial em permeio de dor.
— Sim, o conheço — afirmei para o soldado, que parecia esperar a aprovação de seu patrão.
— Se o senhor Van Persen o tem como conhecido, apenas suplico que comprove sua relação com investigação ou servidão para com a justiça — pediu o Rei, já convencido.
Os soldados o desmobilizaram para que o mesmo pudesse apanhar seu distintivo, que logo mostrou-o para o Rei, que fez um sinal para que os guardas o largassem.
— O que faz aqui? — perguntei logo quando movia-se a minha direção.
— Vim segui-lo. Com a pressa que saiu, sabia que era algo de importante e, por sorte, peguei o mesmo cabriolé que você, o que fez com que o cocheiro me dissesse para onde foste, meu caro amigo — detalhou Van Persen, esfregando as mãos por conta da pressão do segurar dos guardas.
— Já que os dois possuem objetivo, nos movamos para o veículo que nos aguarda lá fora! — exclamou o Rei, enquanto seus soldados formavam uma fila admirável para encaixarem-se nos carros.
Saímos primeiro que os outros. Naquela velocidade, alcançaríamos nosso destino em menos de dois quartos de hora. No meio de locomoção movido á alazões dourados, o Rei quis detalhes e como eu desenvolvi minha linha de raciocínio nem tão complexa:
— Se me permite, detetive Van Geboorte, como foi desenvolvida essa façanha? Me refiro a como soube de tudo, como ligou os pontos?
— Os pontos sempre estiveram lá, apenas não os percebemos para ligá-los, Majestade. Estou certo de tudo o que acontecera, mas apenas desejo comprovar os fatos que teorizo. Mas posso dizer-lhe que era óbvio a nacionalidade do homem com quem é traído pela sua ex-mulher, meu Rei, pelo menos para mim. Primeiramente, as pegadas pálidas que estavam imprimidas no batente escuro de sua janela, eram duas; uma de sua mulher, outra do amante dela. Percebidas pela mudança de tamanho, e estilo dos calçados. Percebi, Vossa Majestade, que sua mulher usa um tipo específico de sapatos quando visitei seu quarto para afins investigativos, e este estava marcando sua presença ilustre no batente; mas o outro, além de ser um tamanho masculino, era de uma marca portuguesa que meu pai e meu tio sempre veneravam, com isso notei a nacionalidade. Também foi impulsionada esta teoria pelas palavras expelidas de sua boca, senhor, que sua mulher o traía com um estrangeiro. Este mesmo português, é um mentiroso infame, que já mentiu até mesmo para mim, fingindo ser um porteiro de universidade, que estava nas fichas do oficial Van Persen, este que nos acompanha.
— Não pode ser! — exclamou o oficial, surpreso e com indignação estampada na face.
— Sim, este usava um documento falso. E realmente, é um professor universitário clandestino de Matemática, o que ajudou na desenvoltura de outros pontos do caso.
— Então este português esteve fabricando seus maus lençóis desde que chegou neste país. Que salafrário! — afirmou o Rei, impondo certa tonalidade de raiva, mas mantendo a classe.
— Este foi apenas um pequeno prefácio do episódio criminalístico que estes dois desenvolveram — acrescentei vivamente, entrelaçando os dedos.
Depois dessa rápida demonstração de meus métodos, movi minha cabeça para a paisagem que se projetava no horizonte da tarde e mergulhei-me em pensamentos sobre o porquê de todo o acontecimento, enquanto Van Persen e o Rei Guilherme III debatiam sobre política asiática.
O tempo finalmente se foi, passou como vento de outono tardio. Meus pensamentos me fizeram viajar para uma realidade longínqua, onde as hipóteses sobre o caso eram várias. Paramos o carro, saltamos direto para a estação, porém havíamos aterrissado no lado direito das plataformas, que esta iria para o porto, onde seria tomado a embarcação para a Inglaterra. Eram 16h20, e se eles não estivessem lá para começar o processo de imigração, então eu deveria pensar rápido. A plataforma estava cheia de pessoas, notava-se que vinham de diferentes lugares da Europa, pois podia-se ouvir conversas em italiano, português, inglês, francês, alemão, entre outras.
— Certo, Dominic, estamos aqui, mas onde se encontra os mal-feitores? — perguntou apressadamente o oficial, enquanto nós três púnhamos nossas cabeças erguidas para fora da multidão como suricatos, a fim de os encontrar.
— Majestade, como estava vestida sua mulher neste dia? — perguntei, para poder procurá-los melhor.
— Encontrava-se vestida com um vestido longo, amarelado e com rendas douradas na cintura — descreveu imediatamente o Rei.
Deslizando os olhos pelo mar de gente, os identifiquei. O português mentiroso usava o mesmo chapéu do dia no qual nos encontramos pela primeira vez. Saí em disparada atropelando civis, esbarrando meus ombros largos em todos que se transporiam diante de mim, e oficial era responsável pelos pedidos de desculpas, já o Rei, atraía olhares incrédulos. O par se encontrava na plataforma que ia para Portugal, ou seja, a contrária da qual estávamos; tínhamos que atravessar os trilhos.
Enquanto corríamos, um sujeito maltrapilho nos parou, interrompendo passagem, para pedir esmolas caridosas. Por meio de resmungos e gemidos, o rosto de Van Persen se deformava indicando estranheza:
— Mas que sonoplastia mais horrenda e desagradável, meu caro! — exclamou enquanto procurava uma brecha para correr, como todos nós.
— Por Deus, Van Persen, não seja rude! Este homem é mudo e surdo! — descrevi com certa impaciência. No mesmo momento, conversei com ele por meio do alfabeto de sinais, que aprendi numa experiência na Bélgica. O informei que estávamos apressados, e que não tínhamos nada para dar-lhe. Assim, este abriu espaço por entre a multidão.
Nossa corrida até a altura que se encontravam os criminosos, nos deixou demasiado ofegantes, mas parece que o Rei despertou um sentimento involuntário quando, por um vislumbre, estava de frente para sua amada, mas os trilhos criavam uma distância de dez metros de ambos. E assim, gritou:
— Sofia!
Nesta hora a mesma se assustou, em seu vestido amarelado e com um chapéu que lhe cobria parte da face, pendia uma sacola vermelha que estava em suas costas, e tinha o formato exato da coroa.
— Vamos, Sofia. Volte para o Palácio e fazemos nossas pazes! — acrescentou o Rei, paralisando a multidão em olhares fixos a ele.
No momento de pronunciação destas palavras, podia-se ver o português atrás dela, também estupefato. O mesmo, agarrou a mão de Sofia e a fez correr, neste momento, o trem encostou na plataforma para recolher seus passageiros. Claramente, teriam corrido para dentro do veículo. Nisso, quis pular nos trilhos e saltar para a outra plataforma, mas vinha um trem, recostando também aos poucos. Não temi, e antes que pudesse controlar meus nervos, me vi em alta velocidade nos trilhos, em direção ao outro lado. Parece que o mundo se passou lentamente diante de meus olhos, vi as pessoas encarando admiradas o meu salto no trilho, Fritz e Guilherme III boquiabertos, e apenas um movimento ligeiro com meus pés para que não fosse pego pelo trem. E assim fiz. Senti o vento violento do trem nas minhas costas, e logo, estava em cima da plataforma. Entrei no trem, e comecei a procurar os dois criminosos que encobriram a vida do governante de meu país de nuvens negras.
Pairando os olhos sobre cabeças viajantes, vi uma parte do vestido amarelado de Sofia entrando em outro vagão pela porta interna do trem, e assim os persegui até ficarem encurralados no final do veículo. Já sem saída, me avistaram e se encontravam transparentes de tão pálidos, até que localizaram o banheiro interno e se trancaram lá dentro. Em meio de chutes na maçaneta, os aterrorizei:
— Não adianta ficarem presos aí dentro! Uma hora terão que sair, e será antes deste trem partir!
Insisti tanto nos chutes que a porta finalmente se rompeu, e pensei comigo mesmo: "que sucesso de minha parte, eu arrombei esta porta sozinho. Logo eu que sou magro e raquítico". Ao cair da porta, os dois estavam recostados na janela do banheiro, aterrorizados, até que Vasco de Montra, o amante, toma a coroa ensacada da mão de sua mais nova mulher, e sai pela janela antes que eu pudesse impedi-lo. O trem começara a andar, e já atingira velocidade considerável quando decidi saltar da janela. Contudo, não poderia abandonar a outra criminosa, que algemei, e joguei pela janela de modo hilário. Mal pude conter o riso, mas preocupava-me com o fugitivo que estava com a coroa.
Finalmente, o trem que iria para o porto, se locomove, e o Rei e o oficial, podem enxergar o que acontece neste lado da estação. Descem para os trilhos rapidamente, e se deparam com Sofia de quatro, algemada e com a cara ralada.
— Foi uma situação de emergência — expliquei, sacudindo a terra da roupa. Percebi que Fritz também esboçava risos leves. — Agora, Majestade, onde estão seus homens? Os vi saindo atrás de nós.
— O cocheiro deve ter tomado uma rota alternativa, senhor.
— Então, tire este pobre-Diabo dos trilhos e tome conta dela, senhor, pois eu e Van Persen iremos atrás do amante.
Com esta frase me despedi do Rei, e corri vislumbrando a pequena mancha de meu inimigo á frente.
— É melhor estar em forma, oficial. Temos de correr um bocado. Também, espero que possua seu revólver consigo — disse, já ofegante.
— Estou com ele, detetive. Não se preocupe, eu corro maratonas.
De primeiro, duvidei do sujeito, mas após alguns instantes, ele me ultrapassa e assim chega mais perto do elemento e arrisca, atiçando sua arma da cintura, um tiro em seu pé. Erra, mas é isto o que faz o português cambalear de susto, tropeçar e cair, o que nos ajudou a diminuir a distância do homem.
Van Persen finalmente o alcançou, lançou-se no ar, agarrando suas costas e o fazendo cair. Eu ainda estava distante, mas foi o tempo preciso para o oficial botar-lhe as algemas e comemorar calorosamente o fato que tínhamos recuperado a coroa. Estava com a sacola vermelha em mãos, e me mostrava, quando o criminoso lhe deu um soco de mãos juntas em seu nariz — com tanta veemência, que o fez sangrar —, e agarrou o artefato novamente, saindo correndo. A estação encontrava-se no alto, e logo do lado, havia uma casa com várias torres próximas dos trilhos, e foi para esta exata casa que ladrão pulara. Livre de rodeios, pulei para o telhado junto dele.
Era óbvio que pretendia entrar pela janela aberta da casa e assim traçar sua fuga. Sabendo disso, me pus em sua frente. Neste momento, o fugitivo me dera uma cabeçada doída e que me fez cambalear, mas não por muito tempo. Logo que me recompus, lhe dei um soco pela esquerda que quase o fez cair na tenda de frutas embaixo de nós, vendo-o sem muito equilíbrio, dei um chute na coroa que a fez voar, assim tomando sua posse. Mesmo sem a coroa, queria fugir, ou ao menos me dar uma bela surra. Entramos num combate corporal violento, e já que o sujeito desejava um combate, era um que ele teria: agarrei-o pelo pescoço e com o saco que continha o artefato amarrado no braço, me joguei junto a ele na tenda de frutas que havia. A altura não foi de toda feia, e não tive ferimentos devida a amortecida da queda no toldo. As frutas se espalhavam e corriam enquanto nos levantávamos, e junto delas, ia a coroa que escapara de seu embrulho e agora rodava pela rua. Nos encaramos e saímos para apanhá-la. Nisso, apanhei um saco de batatas que estava em minhas proximidades, e não hesitei quando a joguei em seu pés, o que o fez cair no solo úmido do final de tarde. Estava caminhando gloriosamente para a coroa quando um pé a para:
— Há uma escada da estação para cá, poderiam tê-la utilizado — afirma uma voz suave, que logo reconheci.
— Ora, Van Persen, este era o modo mais rápido e eficiente para a ocasião — afirmei, enquanto o Rei chegara com seus homens atrás dele, e dois deles carregavam sua ex-mulher.
— Seus serviços foram muito bem prestados, detetive Van Geboorte — concretou o Rei Guilherme III. — Sou muito grato pelos seus serviços, mas daqui pra frente, eu mesmo gostaria de assumir o destino destes.
— Com todo o prazer, Majestade — abri alas ao Rei para ver o criminoso caído.
— Senhor, gostaria de convidar você e seu amigo da polícia para fazerem uma bela visita, em uma melhor ocasião, ao Palácio Real. Para tomarmos chá e assim, lançar uma luz nesta situação oculta. Os espero amanhã de manhã.
Me senti importante ao convite do Rei, de fato era. Eu solucionei um crime que envolvia o roubo de sua honorável coroa, era o mínimo que poderia fazer. Agora, seria conhecido não só na Holanda, mas e todo o mundo, de acordo com a proporções que este caso tomara.
Depois desta captura dos criminosos, Van Persen me convida para nos distrairmos com uma bela cerveja. Mas recusei, afirmando que tinha de descansar e relaxar a mente, me afogando num bom livro de literatura italiana e minhas boas cargas de meu cachimbo. E assim fiz, chegando em minha residência, o que fiz foi ler, e ler, e ler. Até que me enjoei e me deitei era tarde, três da madrugada, ansioso para lidar com a verdadeira personalidade que era o do governante do território o qual eu habitava.
Finalmente a manhã chegou. Depois de me aprontar, quase saindo de casa, ouço a delicada campainha tocando. Era o Oficial Fritz Van Persen.
— Vamos juntos para o Palácio, detetive. Também não contive a ansiedade.
No caminho, não conversamos sobre nada, mas sobre termos técnicos da polícia para casos e criminosos. O que foi divertido de aprender, até que chegamos no destino. O Rei nos esperava pessoalmente na porta principal de sua habitação, e tudo lá dentro estava tão perfeito como se nunca tivesse tido um atentado como houve no dia anterior.
— Por favor, senhores. Meu criado os acompanhará até nossa sala de chá — descreveu o Rei.
Em instantes de uma boa caminhada naquele espaço enorme, chegamos a um cômodo confortável, decorado apenas com branco, o que destacava nossas xícaras e pires cinza, com desenhos barrocos. O criado puxou-nos a cadeira para que nos sentemos numa mesa redonda, coberta pelo pano grande branco, rendado em dourado. Nos sentamos, e logo após, vislumbrava-se a silhueta bem-vestida do monarca, Guilherme III. Sentou-se sem dizer uma palavra e depois de um longo gole em seu chá, soltou:
— Espero que tenha o conhecimento de minha gratidão para com os senhores. A recuperação de minha coroa não foi, evidentemente, fácil, e exigiu muito esforço do intelecto de meu colega Dominic Van Geboorte. Por isso, quero saber em detalhes o rumo de suas análises para chegar nestes resultados impressionantes, se quiser.
— Bem, Majestade, é de primeira mão que revelo tal coisa. Nem para meu parceiro mais próximo, oficial Fritz Van Persen, revelei estes detalhes. São coisas realmente muito vagas e que, na maioria das vezes, só fizeram sentido para meu cérebro. Para início dos fatos, quero estabelecer que sua ex-mulher, que deve estar agora presa, já tinha agido com o português Vasco de Montra antes. Um senhor de uma venda daqui de perto, me descreveu que ela e o elemento perguntaram algo relacionado a horários do Palácio, e se o Rei estava. O que achei estranho e diferente pois, se Sofia estava com ele este tempo todo, deveria saber pois habitava esta residência. Mas logo me toquei que este movimento era para distração, se alguém quisesse ouvir o dono da venda, que ele dissesse algo para tirar a verdadeira ladra logo de questão. Progredindo, sei que o roubo da coroa por parte dela, deve-se ao fato de que não suportava a diferença e discordância com o senhor, e este relacionamento a pressionava. Então, como já tem os filhos criados e um amante arranjado, gostaria de forjar uma moradia tão confortável e elegante quanto essa que habitava aqui na Holanda. Por isso, roubou a coroa de modo que pudesse lucrar com suas pedras e ouros em Portugal. E se a perguntar o motivo, ela dirá isto. Agora, o ato, como foi feito e planejado o roubo. Os donos de vendas e tendas do mercado de rua que envolve o Palácio, relataram que estava cheia a multidão, mais do que qualquer outro dia. E logo depois ouviram um estrondo do quebrar de um vidro. Foi aí que liguei os pontos óbvios: espelhos foram postos de modo que refletiam a mesma multidão para quem olhava de longe, ou seja, não estava tão cheia como pensavam que estava. Nisso, os dois criminosos entraram, pelas brechas deixadas nos espelhos, para o Palácio, assim ninguém os notaram. Já penetrados no território, o único fator que os atrapalharam foi os guardas. A posição dos guardas, Majestade, se não estou enganado, formava um triângulo retângulo, aí que entrega o professor. Vasco, como o descrevi ontem, mentiu para mim uma vez, afirmando ser porteiro. Logo, descobri por suas características que era professor universitário de matemática, o que me rodeou uma pergunta: "por que ele gostaria de esconder que é professor universitário?". Mas a resposta, na verdade, é bem simples, ninguém sentiria falta de um porteiro, mas sim de um professor faltante. Mas minhas suspeitas envolta dele eram poucas e injustificadas: não era porque Vasco de Montra era mentiroso, que eu o apontaria como suspeito, mas o fato de saber fazer a operação do Teorema de Pitágoras — cálculo feitos a partir de triângulos retângulos —, consequência de seus estudos matemáticos. Assim, saberia exatamente o tempo de movimento de cada um dos soldados em relação a sua formação. Informou sua amante, que, pelo o que notei em seu quarto quando o analisei, é lutadora de artes marciais e, além disso, conhece seus empregados. Dessa forma, os três soldados foram os menores dos problemas. Mas durante a luta, um golpe atingiu e quebrou um dos espelhos postos, o que alarmou os guardas internos. Consequentemente, os mal-feitores tiveram que se esconder, e escolheram pilares perto da porta para isso. Depois que os outros soldados foram socorrer os outros, eles penetraram o Palácio e trancaram as portas, assim os outros não entrariam. Usaram uma situação desgraçada para seu próprio benefício.
"Ainda lá dentro, os dois se dividiram e cada um apanhou um punhado do pó pálido que desmaia seres vivos, feitos pelo português, que soube disso através de estudos químicos, como li em sua ficha em momento oportuno na delegacia. No mesmo tempo, para que um grupo não pudesse socorrer o outro, lançaram o pó dentro das salas. Pelo exame analítico que fiz na sala onde repousava a coroa, Sofia própria a roubou, pela presença de dedos femininos, finos e delicados apoiados na almofada vermelha. Depois, sabendo que as autoridades judiciárias desconfiariam, os dois, como maneira de distrair o investigador, organizaram os corpos na porta do quarto que Vossa Majestade se encontrava. E para aumentar o nível de sua certeza para com a distração, apanharam uma espada da armadura da Idade Média mais próxima, que enfeita os corredores do Palácio, e furaram cada soldado em seu peito para depois o último, cortar-lhe a garganta para fingir que o senhor tivesse sido traído por um de seus empregados. Detalhe, o senhor não prestou atenção que seus homens não empunham espadas, apenas rifles? Isto foi importante para a organização dos fatos, sendo que uma armadura empunhava o ar pela falta de sua arma branca. Fui tolo de sempre procurar razões e feitos que exigem o máximo do meu intelecto, mas as pessoas nem sempre são tão aplicadas assim. Os par de pregos afundados na paredes, acima das janelas dos quartos vizinhos, são um bom exemplo. Pela investigação que fiz minuciosamente pelos quartos, notei pegadas de diferentes tamanhos (que puderam ser descobertas pois ambos pisaram no pó "desmaiador"); no quarto em que o senhor escrevera a carta anunciando o divórcio e a separação, havia as pegadas de Sofia, que pregara os objetos ela mesma, já na habitação vizinha, havia pegadas do português — que descobri pelo modelo de calçado específico de uma marca portuguesa — e de sua amante. Com isso, deduzi que o rumo traçado para a fuga, foi o seguinte: os dois furaram as paredes com dois pregos cada, para que pudessem pôr um trapo extenso que ia até o solo, que dava no jardim detrás. O pano longo se localizou no meio das janelas, por fim, pois juntaram dois pedaços deles, e os dois vinham dos lados até se compilarem como uma só rota de fuga. Então, como sabiam que Vossa Majestade se encontrava no ambiente vizinho, se dispuseram de saltar juntos; Sofia agarrada em Vasco, e este segurava os trapos firmemente. Saltaram da janela esquerda, mas o plano de descer reto, no meio das janelas falhou. Obviamente por conta da gravidade e da força que o criminoso impôs ao saltar de lá de cima, o que os fez serem jogados pro lado direito do prédio, o que explica o afundamento atípico no gramado embaixo da janela do quarto que o senhor estava dissertando sua escrita. Deveria ter conhecimento mais aprofundado de seu terreno, Majestade, pois aquela parte do solo é oca, o encanamento é apenas coberto por finas madeiras e seguidas de grama. E assim, fugiram pelos fundos em posse da coroa.
"Para descobrir para onde iriam, foi fácil e não me custou muito tempo, apenas uma corrida exaustiva até um pôster informativo do itinerário dos trens imigratórios. Se fugiram, não seria para um país que não pudessem se comunicar, então, ao menos um deles tinha de ser bilíngue. Mas isto não seria necessário se o amante de Sofia fosse português, logo fugiriam para Portugal. Desta forma completei meu raciocínio."
— O seu talento é admirável, senhor Van Geboorte — orou o Rei Guilherme III, dando um pequeno gole em seu chá. — Por isso, quero fazer uma cerimônia pública, para todos os cidadãos holandeses poderem apreciar o ganho de medalhas que prestigiarei para os senhores. Esta ocorrerá daqui exatas duas semanas, no coração de Amsterdã. Reconheçam, senhores, que o prestígio pelo qual passei a ter por vocês é de grande valor, e espero que possamos manter uma relação próxima para discutirmos termos legislativos, como representantes diretos de população holandesa.
— Nós quem temos de agradecer-lhe, Vossa Majestade, pela oportunidade de lidar com um caso de tamanha proporção — agradeceu o oficial, com o orgulho e patriotismo ressaltados.
Depois disso, começamos uma discussão agradável sobre leis e possíveis soluções para problemas na legislação de nosso país. Ao longo da conversa, o monarca se mostrou aberto e brincalhão, revelando a sua, anteriormente mencionada, paixão pelo exército e armada. Podia-se ver a rodela branca do fundo da xícara, estávamos satisfeitos com o chá e pelo trabalho que eu e o oficial exercemos — o deixei ter o mínimo de crédito possível, já que a única coisa que realizou foi acompanhar-me na hora exata da perseguição. Com o fim da nossa cerimônia do chá, o Rei se fez cavalheiro e nos acompanhou até a saída principal do Palácio Real, e por fim, me informou:
— Sempre soube que minha ex-mulher possuía um apreço muito grande pela cultura portuguesa, mas não desconfiei que pudesse me trair de todas maneiras possíveis para viver seu sonho em Portugal.
— É uma pena que esteja passando por isso, Majestade. Mas é mais apropriado os dois libertos de tantas diferenças. Foi um prazer passar esta agradável tarde com o senhor, até a próxima — me despedi tirando-lhe o chapéu, enquanto um mordomo nos acompanhava e Van Persen se despedia cordialmente do Rei.
— Estou muito orgulhoso de nós mesmos, nunca pensei que seríamos tão importantes a ponto do Rei Guilherme III desejar nossa futura presença, e manter um laço considerável conosco — disse empolgado o oficial que se sentia o dono do planeta Terra.
— Não vá esperar grandes holofotes perante nós, meu colega — alertei, sendo antipático. — O Rei apenas se projetou desta maneira pois o ajudamos recuperar aquele artefato que aprisiona uma fortuna em si.
— Oh! Aí está meu cupê! — exclamou o oficial, não parecendo abalado com minha resposta seca — Não deseja uma carona, meu caro amigo?
— Não, espero outro carro. Vá repousar.
Assim que Fritz fora despachado, eu me dei o luxo de fumar uma bela rajada de cachimbo fitando um dos canais. Honestamente, era uma das várias belezas daquele meu país, e que me orgulho dele. O frio se aproximava e assim me expulsara daqueles minutos filosóficos perante as águas que banham o concreto apressado da cidade. Caminhei, entre as ruas vazias e as pedaladas que davam os corajosos no frio. Os prédios tortos, formando uma formação irregular da linha deles, e assim chamei o primeiro cabriolé que vislumbrei.
Nas duas semanas decorrentes antes da cerimônia pública, não houve casos criminalísticos em Amsterdã ou em qualquer outra parte da Holanda. O país se mobilizou perante as manchetes de roubo e prisão de Sofia, como se ela tivesse morrido e os cidadãos se encontravam em silêncio e luto profundo. Até mesmo os mal-feitores se pararam. Todos os dias que ia para a delegacia para consultar se havia algum caso, apenas terminava jogando xadrez com Van Persen, ou tomando chá com alguns administradores, pela falta de casos. Até que o grande dia da cerimônia chegou, batendo na minha porta como um furacão de emoções indelicado.
Quando cheguei no local marcado pelo Rei, a praça estava maciça de tantas pessoas que não possível enxergar o chão. Subi no altar e lá estava o oficial, em seu melhor traje á rigor, neste, pendia seu distintivo, e também o Rei, bem-vestido como de costume.
— Estes, meus cidadãos, foram os homens que solucionaram todo este caso e que fizeram possível a recuperação meu bem mais precioso, que me designa um digno rei! — exclamou o monarca para toda a multidão agitada — Então, como prova de minha gratidão, os reconhecerei como civis de alta dignidade e honestidade, os prestigiando com estas medalhas douradas.
Eu e Fritz fitávamos a multidão calorosa, ele com um sorriso, eu estava sério. Houve uma pausa das falas de efeito do Rei, para que este tirasse de uma maleta de couro com o interior avermelhado de veludo, as nossas medalhas — que se encaixavam no tecido como um molde projetado. O Rei, então, caminhou no altar, e pôs o medalhão na envoltura do pescoço do oficial e balbuciou algumas palavras de honra, as quais fui ensurdecido pelo nervosismo. Por fim, chegou a minha fez, e fazendo como meu abaixasse para que fosse possível a ação, ele me dirigiu umas palavras de gratidão e honra, e me atrevi:
— Vossa Majestade, se me permite, devo perguntar como acabaram os criminosos?
— Você não deveria se dar o trabalho da preocupação, mas já que tem o interesse: Sofia teve o rumo da prisão perpétua, quem deixei os juízes julgarem por crime a autoridade máxima da nação. O português mentiroso, Vasco de Montra, foi condenado á pena de morte.
— Pena de morte? — exclamei, tentando manter o tom de voz baixo — Mas isto não é abolido aqui na Holanda?
— Sim. Mas como autoridade máxima, eu mesmo quis tratar do negócio dele. E também, ele nunca foi um cidadão holandês, sempre foi ilegal. Portanto, pertence a Portugal, onde a pena de morte é exercida, então o tratei como cidadão digno português.
— Certamente — silabei, com um pouco medo nas palavras anteriormente ditas do Rei.
Quando tudo estava acabado, as medalhas recebidas e estávamos de pé para a multidão, deixei o nervosismo de lado, pois em nada me ajudaria. Então, decidi curtir o momento, apreciar os sentimentos vitoriosos que invadiam meu peito naquela sucessão de acontecimentos históricos. E como isto mudaria minha vida daqui para frente, estaria estampado nas manchetes de jornais famosos e reconhecidos mundialmente: "O detetive que solucionou o caso da coroa holandesa". Eu seria um fenômeno,e a carga de responsabilidade em cima de minha pessoa seria enorme, tinha de estar preparado para estas proporções; E concluindo me toquei, o quão gratificante é o retorno de meu trabalho bem exercido. E que me orgulho dele e de meu patriotismo que sempre fiz questão de possuir.